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Publicado em 12-Abr-2016 às 14:49

Financiamento é necessário

Com a mudança de quadros comunitários de apoio, a fase de transição revelou-se longa e dolorosa para várias organizações, provocando a ruptura e a fragilização de muitas iniciativas, situação que foi ainda bastante agravada pelo contexto de crise em que temos vivido.

 

O financiamento tem constituído um verdadeiro problema para as associações de desenvolvimento local, responsáveis pelo programa LEADER. Criada em 2000, a Federação procura agora lançar muito rapidamente, as linhas de financiamento que os GAL/ADL irão gerir nos territórios rurais.

Para Regina Lopes, presidente da Federação Minha Terra, apesar das dificuldades sentidas, a Federação considera ter um saldo positivo na sua actividade, como se constata pelos Programas de Desenvolvimento Rural 2007-2013 do continente e das regiões autónomas, que estão em fase de encerramento, onde a abordagem LEADER apoiou o desenvolvimento de mais de seis mil projectos, que mobilizaram um investimento de cerca de 820 milhões de euros e permitiram a criação de cerca de sete mil empregos nas zonas rurais.

 

Desde a sua criação, em 2000, como se pode resumir a actividade da Federação Minha Terra?

As Associações de Desenvolvimento Local (ADL) associadas da Minha Terra são – algumas desde 1991 – responsáveis pela gestão do Programa Leader, que começou por ser uma iniciativa comunitária e hoje integra os Programas de Desenvolvimento Rural. A gestão deste programa proporcionou-lhes uma experiência e uma capacidade de intervenção nos territórios rurais muito relevante e conduziu à organização destas entidades num movimento associativo baseado num modelo de desenvolvimento que aposta nas pessoas e organizações locais, e numa abordagem ascendente que dá voz às comunidades rurais. A constituição da Federação, no ano 2000, permitiu aprofundar este modelo de intervenção, valorizando muito a partilha sistemática de boas práticas que marcam o nosso trabalho, entre as quais destaco a descentralização, a proximidade, a inovação e a participação dos actores locais. A criação da Federação como estrutura de nível nacional tem permitido por um lado um trabalho em rede de capacitação e visibilidade do trabalho dos associados, mas fundamentalmente a defesa dos interesses das comunidades rurais.

 

Quais as áreas preferenciais de actuação dos associados da Federação ao nível local?

O trabalho em parceria é uma marca identitária da intervenção das ADL, que em cada território sentam “à mesma mesa” agentes da economia, do social, da cultura, da administração local e muitos outros sectores. Olhar e intervir num território com base em parcerias deste tipo e com instrumentos que permitam apoiar o crescimento económico e a competitividade territorial e, simultaneamente, criar condições para esbater as diferenças em termos de condições de vida com os espaços mais urbanos, ou seja, aprofundar a coesão territorial, é o que nós, as ADL, fazemos há mais de 20 anos.

O facto de serem estruturas que privilegiam uma visão integrada dos territórios (por oposição a uma visão sectorial), que integram agentes de diferentes áreas e que possuem equipas técnicas jovens e preparadas, faz com que estas organizações estejam bem colocadas para dar respostas às múltiplas situações que caracterizam o desenvolvimento local, nomeadamente a formação profissional, o apoio ao empreendedorismo, as iniciativas de inclusão social. Acresce a mobilização de recursos locais e a gestão de fundos comunitários (Leader/DLBC – Desenvolvimento Local de Base Comunitária) que lhes permitem o financiamento a diversos projectos relevantes para as economias rurais.

 

Considerando que o desenvolvimento local em Portugal é fulcral para atenuar os problemas da interioridade no país, considera que a actividade da Federação e dos seus associados tem tido frutos no domínio do combate à desertificação?

A resposta é categórica – o nosso trabalho tem tido frutos, mas a dimensão da nossa actuação não permite resolver todos os problemas. Consideramos que temos sido parte das várias soluções para os vários problemas existentes no mundo rural, que são complexos e diversos.

Os espaços rurais constituem-se, no actual contexto, como recursos relevantes e indispensáveis à construção de um país mais coeso, mais sustentável, mais competitivo e mais desenvolvido. A expressão do seu potencial depende, em larga medida, da capacidade de integração e articulação das diferentes dimensões e sectores (agricultura, indústria, serviços, cultura, turismo, etc.) e dos agentes com presença nos territórios rurais, assim como da capacidade de mobilização das pessoas, das organizações, das experiências, do conhecimento.

A abordagem territorial assente em parcerias locais que a experiência de intervenção das associações de desenvolvimento local com base na abordagem LEADER tem desenvolvido há mais de 20 anos revela a importância da articulação e integração das várias dimensões e de vários sectores no desenvolvimento rural.

Consideramos que, no contexto actual, o processo de renovação dos recursos humanos na agricultura e nos outros sectores da sociedade implica a criação de contextos locais favoráveis à iniciativa, ao investimento, à investigação, à inovação, à experimentação e à comercialização (e mesmo à internacionalização), para os quais a experiência e a prática das ADL serão de certeza relevantes.

Mais do que nunca, os desafios da nossa sociedade passam pelo envolvimento de todas as pessoas na construção de novos caminhos.

 

Que projectos recentes levados a cabo pela Federação ou pelos seus associados podem ser destacados como exemplos de sucesso?

Nos ciclos de programação anteriores, as ADL sempre corresponderam aos desafios que lhes foram colocados e conseguiram apresentar resultados bastante positivos. Assim, mais do que destacar projectos individuais, parece-me interessante destacar os resultados de uma medida de política pública emblemática gerida pelas ADL, a abordagem LEADER. Nos Programas de Desenvolvimento Rural 2007-2013 do continente e das regiões autónomas que estão em fase de encerramento, a abordagem LEADER apoiou o desenvolvimento de mais de seis mil projectos, que mobilizaram um investimento de cerca de 820 milhões de euros e permitiram a criação de cerca de sete mil empregos nas zonas rurais. De um ponto de vista qualitativo, estas intervenções foram essenciais na estruturação da economia local, na dinamização do emprego, na promoção de uma maior coesão social, colocando as pessoas no centro destes processos de desenvolvimento.

 

Que apoios estatais e outros têm tido, a Federação e os seus associados, para facilitar as suas actividades? Consideram esses apoios suficientes ou podiam e deviam ser mais intensos?

Como já referi, as Associações de Desenvolvimento Local (ADL) associadas da Minha Terra são – algumas desde 1991 – responsáveis pela gestão do Programa LEADER.

A integração do LEADER nos Programas de Desenvolvimento Rural 2007-2013 do continente e das regiões autónomas padeceu de atrasos e de opções inadequadas ao nível do enquadramento regulamentar e normativo. Contudo, foi possível, num contexto marcado por uma recessão do investimento e por sérias dificuldades de acesso ao crédito por parte dos pequenos investidores, apresentar uma boa performance.

Somos muito críticos da arquitectura que orientou a construção do Portugal 2020 no que respeita particularmente ao desenvolvimento rural e estamos, ainda nesta fase, a prosseguir com um processo negocial para atenuar ou mesmo contrariar algumas matérias. De facto, no início da programação, perspectivava-se, no contexto do LEADER/DLBC, uma intervenção plurifundos que permitiria a mobilização dos diferentes instrumentos comunitários (FEADER, FEDER, FSE…), essenciais para dar resposta de forma integrada às necessidades e às expectativas das comunidades locais. Contudo, essa articulação não se verificou, e o resultado são mecanismos de financiamento incompletos e com dotações financeiras, manifestamente insuficientes.

 

No caso dos fundos comunitários associados ao Programa LEADER, a Federação está satisfeita com as verbas alocadas, com a execução do programa e com a avaliação das candidaturas?

Como comecei por dizer, o novo período de programação traz ao LEADER/DLBC desafios associados à dimensão plurifundos (pois além do FEADER, mobilizará financiamento do FEDER e do FSE) pela qual o Governo português optou no continente.

Este modelo de financiamento implica um nível de articulação entre os decisores políticos e na administração cujo processo exige a superação de barreiras históricas e a coordenação de diferentes tutelas, com um apelo claro aos princípios da governação integrada.

Infelizmente, as soluções obtidas até agora são pouco coerentes e eficazes e não cobrem de uma forma mais integral as questões a que é preciso responder nos territórios rurais.

As linhas de financiamento já definidas, os montantes e os tectos financeiros previstos para algumas áreas de apoio, como as pequenas empresas, o pequeno património ou mesmo os serviços de base e de proximidade (cultura, desporto, lazer, área social), estão muito aquém daquilo que os resultados de mais de 20 anos de intervenção dos Grupos de Acção Local (GAL) indicam como necessário fazer, e estão, também, abaixo das expectativas das populações rurais.

Vale a pena destacar ainda o facto de o DLBC Rural destinar as verbas provenientes do FEADER, sobretudo para investimentos no sector agrícola. Tal focalização desafia os GAL, enquanto parcerias e equipas, para se capacitarem e dar resposta a esta realidade e, para mobilizarem esforços e recursos essenciais numa resposta mais adequada às necessidades e às expectativas das comunidades rurais. Esta intervenção mais próxima das actividades agrícolas e da transformação permite melhorar o acesso do pequeno agricultor a estes fundos, e contribuem para densificar as pequenas economias locais.

 

 

Como tem sido a relação entre os associados da Federação e as Caixas de Crédito Agrícola? Como se pode intensificar essa relação?

Tem sido uma relação construída ao longo de muitos anos, no seio de muitas parcerias locais dinamizadas pelas ADL, e onde as Caixas de Crédito Agrícola têm participação.

Há um grande paralelismo entre os dois tipos de organizações: uma forte implantação territorial nas comunidades mais rurais, uma grande autonomia estratégica e de decisão, a defesa dos interesses locais, a valorização e o respeito pelas especificidades de cada território. Ou seja, a cooperação institucional surge como óbvia e natural.

Mais recentemente e na fase de preparação do actual período de programação, a FENACAM e a Federação organizaram em conjunto uma iniciativa com o tema “As Caixas Agrícolas e a abordagem LEADER”, exactamente para promover este conhecimento mútuo e reforçar os pontos de articulação e colaboração entre ambas as federações, enquanto estruturas de nível nacional, mas também com o intuito de fomentar as relações entre ADL e Caixas de Crédito Agrícola nos territórios onde tal ainda não acontece.

Actualmente, estamos a trabalhar no sentido de construir uma parceria relativa à actividade e ao relacionamento financeiro entre as Caixas que constituem o SICAM – Grupo Crédito Agrícola e a Minha Terra – Federação Portuguesa de Associações de Desenvolvimento Local. Pretende-se que a extensão desta relação inclua mecanismos e soluções financeiras ou de condições de financiamento que permitam complementar os apoios que os GAL/ADL vão gerir nos territórios rurais. Consideramos mesmo que esta dimensão financeira se configura como uma peça fundamental para o apoio ao investimento e à dinamização efectiva das comunidades locais.

 

Quais as metas a curto prazo que a Federação Minha Terra quer atingir, para si e ao nível das actividades dos seus associados?

Os desafios que a Minha Terra assume no curto prazo prendem-se com a necessidade de lançar muito rapidamente as linhas de financiamento que os GAL/ADL irão gerir nos territórios rurais. Esta fase de transição revelou-se longa e dolorosa, provocando a ruptura e a fragilização de muitas iniciativas, situação que foi bastante agravada pelo contexto de crise em que temos vivido.

Outro aspecto em que estamos a trabalhar é o de introduzir algumas alterações que permitam uma melhoria significativa nas linhas de financiamento. Pretende-se que estas tenham uma maior adesão às necessidades dos beneficiários dos territórios rurais e que sejam incorporados nos concursos, mecanismos de simplificação.

O processo de qualificação, de reflexão e de trabalho em rede das ADL associadas da Minha Terra é fulcral para que se atinjam os objectivos de desenvolvimento sustentável das comunidades rurais. Para tal, propomo-nos trabalhar internamente no aprofundamento das competências adequadas aos desafios do próximo período de financiamento, mas também nos processos de comunicação necessários para dar visibilidade às boas experiências e resultados da intervenção das ADL.

O debate e a defesa dos interesses das comunidades rurais continuarão a constituir uma preocupação central da actividade da Federação Minha Terra.