Publicado em 11-Abr-2016 às 08:13
“Agricultura tornou-se uma actividade ‘sexy’”
O crescente fascínio pelo sector foi a ideia marcante na conversa alargada ocorrida no seminário organizado pelo Crédito Agrícola, em Vila Nova de Gaia.
Frase dita e repetida por alguns intervenientes, no auditório das Caves Ferreirinha, parece não haver dúvidas sobre a existência de uma espécie de “sex appeal” da actividade agrícola em Portugal. Que pode estar aí para durar. Com as agruras e os desafios próprios de uma qualquer relação.
Receitas de sucesso precisam-se para crescer num mercado cada vez mais aberto. Daí o repto lançado pelo moderador Luís Mira de Silva, presidente da INOVISA, aos intervenientes no painel: como criar uma empresa de sucesso? Respostas prontas não faltaram, com ideias frescas. Por exemplo, a de Amândio Santos, de venda online de ovos para a China, “o país onde são mais caros, enviados numa caixa dourada, ou prateada, capaz de provocar a sensação única no consumidor, de que o ovo acabou de ser posto pela galinha”.
Com o exemplo bem-disposto, quis o presidente da associação PortugalFoods sublinhar que “o consumidor actual valoriza emoções e sensações”. E lembrou que “o sector agrícola não pode estar desligado do e-commerce”, até porque há “negócios de nicho que podem ser rentáveis, se forem únicos e se se conhecer bem o mercado”.
Olhando as exportações, também Manuel Évora, presidente da associação Portugal Fresh, tomou o gosto ao desafio. Se o negócio passar por fruta, legumes e flores nada como se apoiar “no chavão de que têm a melhor cor, sabor e textura”. Uma verdade, segundo o próprio, porque em Portugal, “o tempo que medeia entre a floração e a frutificação é o ideal”.
Além da qualidade produtiva, outros conselhos foram aventados pelos restantes participantes. Para um negócio frutuoso são sempre necessários “parceiros que tragam conhecimento avançado”, no dizer de Pedro Silva, coordenador da TECMinho, e que sejam “estratégicos para a ideia”, na opinião de Ana Paula Xavier, da Federação Minha Terra, segundo a qual “há que ter coragem para pensar fora da caixa”. E tudo isto sem esquecer a necessidade de “estudar, entender e saber mais do que todos sobre o que se pretende fazer”, a receita de Martin Stilwell, CEO do HIT Group, um caso de sucesso no mercado mundial dos concentrados de tomate.
Futuro
Imagine-se um “drone” a sobrevoar uma plantação de tomate, a colher informação sobre a cultura e a enviá-la para o smartphone do agricultor. Parece ficção, “mas é uma tecnologia que está a ser validada e que irá estar disponível nos próximos anos”. Na óptica do português Martin Stilwell, este futuro que se aproxima será “uma solução para regar menos, adubar quando necessário e garantir sustentabilidade”.
Avanços tecnológicos têm aliás alimentado o sector do tomate em Portugal, “uma actividade que estava moribunda no fim dos anos 1980”. Segundo Stilwell, “sobreviveram os optimistas”, que souberam aproveitar dois momentos decisivos. Um primeiro, no início dos anos 1990, com “a rega gota a gota, uma tecnologia israelita, que hoje é banal, em que os portugueses foram pioneiros a usar na cultura do tomate”.
Mais tarde, o novo milénio apresentou-se com uma subida do preço do petróleo. Num sector em que “o custo da energia pesa”, a solução da empresa que dirige foi a de criar “uma nova máquina, com construtores italianos, capaz de evaporar o tomate mais depressa e com mais eficiência”. Conclusão: “Reduzimos custos em 30%.”
Espremidos os resultados, Portugal produz hoje “quatro vezes mais tomate do que no início dos anos 1990”, nas contas do CEO do HIT Group. Em grande medida, segundo Stilwell, por ter percebido que “o factor mais importante na inovação é a abertura à mudança e depois o conhecimento”.
Mercados
Se a inovação e a tecnologia são fundamentais para o sector primário, o debate mostrou também haver “um grande passo entre o que se pode demonstrar em laboratório e um produto vendável ou um processo industrializável”, nas palavras de Pedro Silva, coordenador da TECMinho.
Admitiu o investigador haver “um desfasamento entre as universidades e o mercado”. Deu como exemplo, o caso de um produto capaz de substituir corantes têxteis, “com tecnologia limpa, mais barato, em que se esperava uma start-up de sucesso, mas que ainda não foi vendido. E entretanto os investidores saíram.”
Para esta dificuldade contribuiu também, segundo Pedro Silva, “a falta de condições financeiras das universidades para chegar aos mercados em tempo útil”. Uma situação que melhorou em 2008, com “uma maior dotação orçamental” por via do QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional).
Falando também de dinheiro, Amândio Santos, da PortugalFoods, foi claro ao considerar que, “hoje, a banca olha a agricultura e o agro-alimentar como um sector mais estável, depois de ter visto o que aconteceu no imobiliário”. Ou seja, mesmo em tempos de crise, “as empresas do agro-industrial não foram privadas de crédito, mas tiveram de o pagar”.
Certo é que, em tempos “havia banca que não conhecia o sector”, segundo Amândio Santos, “o que não era o caso do Crédito Agrícola”. Um reconhecimento que foi ainda mais efusivo por parte de Manuel Évora. De pé, aplaudiu a actuação da instituição financeira, como “o grande parceiro, o grande amigo e o grande responsável por a Portugal Fresh ainda existir”.